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O matrimônio eterno de Deus com a humanidade

Fonte - www.padrepauloricardo.org
São João Paulo II, de modo inovador, compara a exposição dos três primeiros ciclos de catequese da Teologia do Corpo a um tríptico[01]. Nesta analogia, o primeiro painel traz a seguinte frase de Nosso Senhor Jesus Cristo: “Mas não foi assim desde o princípio” (Mt 19,3).
O segundo mostra o homem depois do cometimento do pecado original. “Todo aquele que olhar para uma mulher com o desejo de possuí-la, já cometeu adultério com ela em seu coração.” (Mt 5, 27-28).
Finalmente o terceiro e mais importante quadro, fala sobre a finalidade do homem. Partindo da controvérsia de Jesus com os saduceus em Marcos, capítulo 12, extrai a seguinte frase: “Acaso não estais errados, porque não compreendeis as Escrituras e nem o Poder de Deus?”.
O tríptico, portanto, apresenta o homem antes do pecado, durante o estado de pecado e, finalmente, como se tornará depois da ressurreição.
Para se definir algo, a melhor maneira é apresentar a sua finalidade. Pois bem, diante desse tríptico e do que ele apresenta, não resta dúvida de que a finalidade dos corpos é a ressurreição. O homem foi criado para o Céu, para contemplar Deus face a face.
É por isso que a história da humanidade se inicia com um casamento: o de Adão e Eva no Paraíso. Este casamento é como que um sinal, uma flecha que aponta para um outro matrimônio, dessa vez narrado no Apocalipse: o casamento de Deus com a humanidade, as núpcias do Cordeiro. Deixando a linguagem metafórica de lado, temos claro que a finalidade do homem é a sua participação plena na natureza divina.
Sabemos que isso é possível porque em Nosso Senhor Jesus Cristo, na união hipostática, o casamento entre Deus e a humanidade já aconteceu. É por isso também que só se pode pensar em ressurreição do corpo e da alma. Ambos participarão da natureza divina. Por Cristo, com Cristo e em Cristo o homem será introduzido na felicidade de Deus, como um ser humano completo.
Christopher West, no livro que serve de apoio para este curso, cita um outro filósofo católico americano chamado Peter Kreeft que, em sua obra “Tudo que você sempre quis saber a respeito do Céu” (sem tradução em português) afirmou que “Platão estava equivocado quando achou que o corpo aprisiona a alma”. Para Kreeft é exatamente o contrário: uma alma sem corpo é muitíssimo limitada e assim, a não ser Jesus Cristo e a Virgem Maria que já estão ressuscitados, o santos estão num estado de anormalidade. Suas almas estão no céu, é verdade, mas como não ressuscitaram inteiramente ainda estão num estado anormal, incompleto.
Kreeft usa a palavra “obscenidade” para se referir a um corpo sem alma ou vice-versa. Isso explica porque o homem tem medo de fantasmas e de cadáveres: não porque eles possam fazer algum mal, mas porque são uma “aberração”.
Assim, quando um santo “aparece” por permissão divina, é preciso considerar que houve algo de absolutamente extraordinário, um milagre, pelo simples fato de que a alma precisa do corpo para se expressar.
A alma sobrevive após a morte do corpo físico, isso é dado pela observação filosófica, mas corroborado pela revelação e tradição da Igreja. E as almas dos santos estão no céu, junto de Deus, por isso podem amar e interceder pela humanidade. Trata-se da comunhão dos santos. Todavia, estão numa situação anormal, até mesmo aberrante. Eles esperam pela ressurreição de seus corpos para se tornarem plenos.
Quando os corpos ressuscitarem para a glória eterna não só estarão restaurados em seus aspectos físicos, mas também em relação à sua sexualidade: ressuscitarão virginais. Pelo simples fato de que foi assim que Deus os criou, assim é a sua plenitude. Da mesma forma ressuscitarão homem ou mulher.
A plenitude da ressurreição implica também que não haverá, no céu, mais sexo enquanto relação. Não haverá mais casamento, como hoje é concebido, pois ele nada mais é do que um sinal (um sacramento) que aponta para uma realidade futura que, obviamente, estará consumada.
Não haverá igualmente necessidade de roupas para cobrir os corpos. Se hoje as temos é por consequência do pecado, conforme visto nas aulas anteriores. No céu, como São João narra em Apocalipse, os eleitos estarão “vestidos de sol”(12,1), ou seja, revestidos pela glória de Deus. Terão sido lavados pelo sangue do Cordeiro. As vestes serão brancas, como disse o evangelista, pois é a glória de Deus adquirida para a humanidade pelo sangue de Cristo derramado na cruz. Ele que foi crucificado de forma vergonhosa, desnudado de modo infame agora reveste os eleitos. A ressurreição dos mortos, portanto, será a união de cada um com Deus, com Cristo no céu.
Mas, não só isso. Será também a união entre os homens. A humanidade se unirá ao Corpo de cristo, na comunhão dos santos, na glória da Igreja, na Jerusalém celeste. São João descreve esta realidade quando fala da cidade que não precisa de sol nem de lua, pois a sua luz é a glória do cordeiro. É isto que espera o homem no céu.
Quando finalmente acontecer a união com Cristo no céu, a solidão originária, apontada por João Paulo II será plenamente saciada. Deixará de existir. Também a realidade matrimonial iniciada aqui na terra encontrará sua completa realização nas núpcias do Cordeiro, ou seja, da humanidade redimida e, enfim, unida ao Seu Esposo.

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