Fonte - www.padrepauloricardo.org
O primeiro ciclo de catequeses proferidas por São João Paulo II a respeito da Teologia do Corpo versou sobre a análise de uma palavra extraída do versículo 8, do capítulo 19, do Evangelho de São Mateus, quando Jesus diz: "Mas não foi assim desde o princípio." O Papa se põe, ao longo de 23 catequeses, a analisar qual era o projeto inicial de Deus, como Ele pensou a criação.
Antes de mais nada é preciso entender o contexto em que Jesus pronunciou a palavra. Vejamos a passagem completa:
Alguns fariseus aproximaram-se de Jesus e, para experimentá-lo, perguntaram: "É permitido ao homem despedir sua mulher por qualquer motivo?" Ele respondeu: "Nunca lestes que o Criador, desde o princípio, os fez homem e mulher e disse: 'Por isso, o homem deixará pai e mãe e se unirá à sua mulher, e os dois formarão uma só carne'? De modo que eles já não são dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus uniu, o homem não separe". Perguntaram: "Como então Moisés mandou dar atestado de divórcio e despedir a mulher?" Jesus respondeu: "Moisés permitiu despedir a mulher, por causa da dureza do vosso coração. Mas não foi assim desde o princípio. Ora, eu vos digo: quem despede sua mulher - fora o caso de união ilícita - e se casa com outra, comete adultério." (Mt 19, 3-9)
Jesus cita frases oriundas dos dois relatos sobre a criação encontrados no Livro do Gênesis. Do primeiro relato extraiu a frase "E ele os fez homem e mulher" e do segundo "os dois formarão uma só carne". Ora, esta realidade de que Deus criou homem e mulher e de que ambos se unirão foi pervertida pelo pecado original, que se reflete quando Jesus diz: "Moisés permitiu despedir a mulher, por causa da dureza do vosso coração." Portanto, Nosso Senhor está a dizer que existe algo de errado com a humanidade. Trata-se de uma doença espiritual chamadaesclerocardia, uma desordem no modo humano de amar.
Ao analisar com profundidade qual era o projeto inicial de Deus, o Papa João Paulo II começa por esmiuçar o primeiro relato da Criação. Nele, Deus apresenta a criação do homem e da mulher com uma profundidade teológica maior que no outro relato. Vejamos:
Deus disse: "Façamos o ser humano à nossa imagem e segundo nossa semelhança, para que domine sobre os peixes do mar, as aves do céu, os animais domésticos, todos os animais selvagens e todos os animais que se movem pelo chão". Deus criou o ser humano à sua imagem, à imagem de Deus o criou. Homem e mulher ele os criou. E Deus os abençoou e lhes disse: "Sede fecundos e multiplicai-vos, enchei a terra e submetei-a! Dominai sobre os peixes do mar, as avés do céu e todos os animais que se movem pelo chão". Deus disse: "Eis que vos dou, sobre toda a terra, todas as plantas que dão semente e todas as árvores que produzem seu fruto com sua semente, para vos servirem de alimento. E a todos os animais da terra, a todas as aves do céu e a todos os animais que se movem pelo chão, eu lhes dou todos os vegetais para alimento". E assim se fez. E Deus viu tudo quanto havia feito, e era muito bom. Houve uma tarde e uma manhã: o sexto dia. (Gên 1, 26-31)
O Papa João Paulo II notou que não é somente verdade que o homem individualmente falando é imagem de Deus, mas que também a diversidade de homem e mulher, de alguma forma, é imagem de Deus. Existe nela uma bondade originária e, se hoje o relacionamento entre homem e mulher é conflitivo, não era assim no princípio. O Catecismo da Igreja Católica identifica com clareza a causa dessa desordem:
Segundo a fé, essa desordem que dolorosamente constatamos não vem da natureza do homem e da mulher, nem da natureza de suas relações, mas do pecado. Tendo sido uma ruptura com Deus, o primeiro pecado tem, como primeira consequência, a ruptura da comunhão original do homem e da mulher. Suas relações começaram a ser deformadas por acusações recíprocas, sua atração mútua, dom do próprio Criador, transforma-se em relações de dominação e de cobiça; a bela vocação do homem e da mulher para ser fecundos, multiplicar-se e sujeitar a terra é onerada pelas dores de parto e pelo suor do ganha-pão. (1607)
Quando Deus fez a mulher, não a retirou da cabeça do homem, para que ela pudesse sentir-se superior a ele, nem dos pés, para ele pudesse pensar o mesmo. Ele tirou da costela, do lado, o que significa uma igual dignidade entre eles. Portanto, quando o casal, unido em sagrado matrimônio, mantém relação sexual, esta deve ser de "iguais", não deve haver um dominador, um dominado; um senhor, um escravo. Tais práticas levam o casal para longe do projeto inicial de Deus. Nesse sentido, o Papa João Paulo II diz:
Por este motivo pode-se dizer com certeza que o primeiro capítulo do Gênesis se constituiu um ponto inexpugnável de referência e a base sólida para uma metafísica e também para uma antropologia e uma ética, segundo a qual «ens et bonum convertuntur». Sem dúvida, tudo isto tem significado próprio, também para a teologia e sobretudo para a teologia do corpo. (2,5)
O princípio "o ser e o bom se convertem", interpenetram-se, ou seja, se uma coisa é, então ela é boa e se é má, ela é má enquanto não é. Deus não criou o mal, ele não tem entidade, é uma desordem no ser, um vazio que causa desordem. Logo, se o desejo é de ter um relacionamento bom é preciso mergulhar numa reflexão naquilo que é o ser das coisas.
Quando a Igreja "proíbe" algo, ela não está arbitrariamente determinando algo, mas, ao contrário, ela está jogando uma luz sobre o que é bom para o ser. A verdade está no ser e não na convenção. Assim, a Bíblia fornece um conhecimento do que era o projeto originário de Deus para o ser humano.
Portanto, Jesus está dizendo que no princípio o relacionamento entre homem e mulher não era desordenado e que, na raiz do ser homem e do ser mulher existe uma harmonia. Se esta se perdeu foi por causa da "dureza dos vossos corações".
O pecado original distorceu tudo.
ResponderExcluirVerdade! Mas Jesus nos redimiu! (:
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